Mme. Ionesco: a dama do erotismo
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Mme. Ionesco: a dama do erotismo
por Priscilla Santos
O mundo correspondente não é realmente este. Aliás, a realidade não é mais nada além de um capricho da abstração num universo onde, em preto e branco e a pouca luz, vemos a transfiguração, o erotismo insondável, inatingível, fantástico e sombrio das mulheres de Irina Ionesco.
Baudelaire inevitavelmente vem à frente: o escritor simbolista que tanto se dedicou às mulheres fatais, as mulheres-vampiras, certos vultos da noite, é traço-chave nas obras de Ionesco ainda que a artista dissimule ou desconverse: sei que os críticos fazem referências a Baudelaire, aos simbolistas belgas, a Tânatos, a Eros... Não muda o disco. Nascida na França, em 1935, filha de romenos, o destino de Mme. não poderia ser dos mais pitorescos: fugindo de casa ainda moça, foi encontrar abrigo num circo onde foi domadora de cobras, bailarina e alvo de atirador de facas. Em meados dos anos 60, um acidente mudou seus rumos e Irina aproximou-se das artes plásticas através da pintura. É justamente deste momento seus primeiros trabalhos, munida de uma manual Nikon, pôs-se a buscar nas formas dos outros corpos o seu próprio espírito.
É imprescindível que falemos de espírito porque o conjunto de imagens da autora é de fato um conjunto místico. As mulheres retratadas são, antes de tudo, entidades totens que parecem ter irrompido na vida de Ionesco que prontamente estava lá para capturar o momento da aparição num furor de improvisos. Nada de modelos escolhidas por agência, seus padrões são outros. Os olhos buscam lá fora o que parece rondar a si mesma e nem é preciso ler seus críticos e comentadores para se formar uma opinião à vista de cada peça. Ionesco expõe o seu próprio nu em corpos exteriores de uma forma contundente.
São mulheres super potentes, auto suportadas, insondáveis, sempre muito ornadas de seus objetos, plumas, véus, espelhos. Principalmente de suas jóias, que são símbolos; encenações, traduções de vida, morte, nascimento, amor, sonho e loucura, como lista a própria autora. Excessivamente maquiadas ou deliciosamente mascaradas, são fantasticamente feitas peça de fetiche: fetichistas flertando com o perverso, com a submissão, com o gótico. Nuas sob quaisquer aspectos.
Ionesco eleva o erotismo à mais cortante intimidade, a um aterrorizante segredo do qual não se pode fugir: a sedução feminina, a sedução letárgica. Uma sedução que já não diz respeito às formas ou à idade das fotografadas. Sua sensualidade provém também de viagens oníricas, de doçuras, florestas encantadas e maciez, brincadeiras ingênuas numa trama de provocações. Os adjetivos são inesgotáveis, a reflexão é um delírio.
Irina Ionesco teve sua primeira exposição em 1974 na Nikon Gallery de Paris, depois em Londres, Holanda, Nova Iorque, e então o mundo em exposições itinerantes que ainda hoje se realizam. Trabalha hoje com editoriais de moda mas não esconde que não é das suas tarefas favoritas. Vivendo em Paris, ainda hoje Mme. Ionesco produz e, distante da fotografia digital, busca novos encontros.
Em Julho, quando esteve no Brasil expondo na galeria do SESC Copacabana, concedeu uma entrevista à revista Época onde revelou seus planos de um novo projeto; “um trabalho inspirado em Alice no País nas Maravilhas, com uma menina de oito anos”. Para ela não é uma afirmação chocante, para os que conhecem seu trabalho, é um novo mergulho no controverso. Um mergulho que atende pelo nome de Eva...
As imparidades de sua trajetória se refletem num olhar apurado sobre o que de insondável há na alma feminina por uma tangente de sensualidade. Mesmo antes de sua primeira exposição, em 1975, a fotógrafa francesa Irinia Ionesco já havia despertado o interesse de um grupo particular de artistas; mas seu êxito – paradoxal - e aclamação viriam de seu maior escândalo; a exposição Eloge de Ma Fille entraria na galeria Nikon de Paris e era esse mesmo olhar fetichista agora voltado para ela, Eva Ionesco... dos 5 aos 10 anos, em ensaios eróticos.
Segundo Irina, a proposta que originou a série de fotografias surgiu da própria Eva; eram sem dúvidas anos muito diferentes dos nossos, de uma busca e aceitação da liberdade sexual, ou ainda da liberdade dos corpos. Como mulher e artista, fruto de sua época, não pareceu estranho à francesa que Eva também pudesse ser alvo de fotografias simbolistas e que fosse focada exatamente como as outras mulheres, adultas, alvos das lentes de Irina.
As datas divergem - uns falam em 4 a 11 anos, outros de 5 a 10 anos de idade; ficamos aqui com a segunda possibilidade por ser a mais encontrada nas fontes – mas, sistematicamente, ano após ano, a fotógrafa utilizou sua filha como modelo em fotografias branco & preto de extremo apuro e ousadia. Ousadia até maior que a encontrada nas demais imagens obsessivas produzidas por Ionesco, muito maior. Eva aparece em nus, mas o efeito aterrador é o mesmo se ela é capturada vestida, como isso? É intrigante.
Assim a menina Eva surge como criança-mulher nos mesmos ares sombrios, ornada com dezenas de jóias ou bijuterias ordinárias, artefatos que falam deste mundo particular onde convivem delírio, morte, sensualidade e paixão. Seria quase uma entidade, um totem, um mito... Mas Eva era e é real: o choque é inevitável. Comunidade artística e opinião pública se puseram maciçamente contra Irina; a primeira – que já classificava seu trabalho como um desfile de maus gostos – considerou a coleção como o ápice dos absurdos, aquilo simplesmente não era arte. Já o público, numa oposição já esperada e recorrente, a execrou alegando uma falta explícita de moralidade.
Nada disso, logicamente, impediria Eloge de ma fille de entrar para a história da fotografia e do erotismo. Mesmo hoje, em que vivemos tempos de tão intenso tráfego de material de pedofilia, tempos que talvez nos turve a visão para certos aspectos fascinantes do bizarro ou do cruel, as fotografias que Irina Ionesco fez de sua filha permanecem inadvertidamente cheias do mesmo conceito, da mesma busca pela natureza do ser mulher vista através dos anos que passam para Eva e a revelam tão ou mais terrível (e uso terrível no sentido de espantoso) que a Lolita de Nobokov.
fonte:
Mme. Ionesco: a dama do erotismo
Eva sob o olhar de Irina Ionesco: dos 5 aos 10 anos
O mundo correspondente não é realmente este. Aliás, a realidade não é mais nada além de um capricho da abstração num universo onde, em preto e branco e a pouca luz, vemos a transfiguração, o erotismo insondável, inatingível, fantástico e sombrio das mulheres de Irina Ionesco.
Baudelaire inevitavelmente vem à frente: o escritor simbolista que tanto se dedicou às mulheres fatais, as mulheres-vampiras, certos vultos da noite, é traço-chave nas obras de Ionesco ainda que a artista dissimule ou desconverse: sei que os críticos fazem referências a Baudelaire, aos simbolistas belgas, a Tânatos, a Eros... Não muda o disco. Nascida na França, em 1935, filha de romenos, o destino de Mme. não poderia ser dos mais pitorescos: fugindo de casa ainda moça, foi encontrar abrigo num circo onde foi domadora de cobras, bailarina e alvo de atirador de facas. Em meados dos anos 60, um acidente mudou seus rumos e Irina aproximou-se das artes plásticas através da pintura. É justamente deste momento seus primeiros trabalhos, munida de uma manual Nikon, pôs-se a buscar nas formas dos outros corpos o seu próprio espírito.
É imprescindível que falemos de espírito porque o conjunto de imagens da autora é de fato um conjunto místico. As mulheres retratadas são, antes de tudo, entidades totens que parecem ter irrompido na vida de Ionesco que prontamente estava lá para capturar o momento da aparição num furor de improvisos. Nada de modelos escolhidas por agência, seus padrões são outros. Os olhos buscam lá fora o que parece rondar a si mesma e nem é preciso ler seus críticos e comentadores para se formar uma opinião à vista de cada peça. Ionesco expõe o seu próprio nu em corpos exteriores de uma forma contundente.
São mulheres super potentes, auto suportadas, insondáveis, sempre muito ornadas de seus objetos, plumas, véus, espelhos. Principalmente de suas jóias, que são símbolos; encenações, traduções de vida, morte, nascimento, amor, sonho e loucura, como lista a própria autora. Excessivamente maquiadas ou deliciosamente mascaradas, são fantasticamente feitas peça de fetiche: fetichistas flertando com o perverso, com a submissão, com o gótico. Nuas sob quaisquer aspectos.
Ionesco eleva o erotismo à mais cortante intimidade, a um aterrorizante segredo do qual não se pode fugir: a sedução feminina, a sedução letárgica. Uma sedução que já não diz respeito às formas ou à idade das fotografadas. Sua sensualidade provém também de viagens oníricas, de doçuras, florestas encantadas e maciez, brincadeiras ingênuas numa trama de provocações. Os adjetivos são inesgotáveis, a reflexão é um delírio.
Irina Ionesco teve sua primeira exposição em 1974 na Nikon Gallery de Paris, depois em Londres, Holanda, Nova Iorque, e então o mundo em exposições itinerantes que ainda hoje se realizam. Trabalha hoje com editoriais de moda mas não esconde que não é das suas tarefas favoritas. Vivendo em Paris, ainda hoje Mme. Ionesco produz e, distante da fotografia digital, busca novos encontros.
Em Julho, quando esteve no Brasil expondo na galeria do SESC Copacabana, concedeu uma entrevista à revista Época onde revelou seus planos de um novo projeto; “um trabalho inspirado em Alice no País nas Maravilhas, com uma menina de oito anos”. Para ela não é uma afirmação chocante, para os que conhecem seu trabalho, é um novo mergulho no controverso. Um mergulho que atende pelo nome de Eva...
As imparidades de sua trajetória se refletem num olhar apurado sobre o que de insondável há na alma feminina por uma tangente de sensualidade. Mesmo antes de sua primeira exposição, em 1975, a fotógrafa francesa Irinia Ionesco já havia despertado o interesse de um grupo particular de artistas; mas seu êxito – paradoxal - e aclamação viriam de seu maior escândalo; a exposição Eloge de Ma Fille entraria na galeria Nikon de Paris e era esse mesmo olhar fetichista agora voltado para ela, Eva Ionesco... dos 5 aos 10 anos, em ensaios eróticos.
Segundo Irina, a proposta que originou a série de fotografias surgiu da própria Eva; eram sem dúvidas anos muito diferentes dos nossos, de uma busca e aceitação da liberdade sexual, ou ainda da liberdade dos corpos. Como mulher e artista, fruto de sua época, não pareceu estranho à francesa que Eva também pudesse ser alvo de fotografias simbolistas e que fosse focada exatamente como as outras mulheres, adultas, alvos das lentes de Irina.
As datas divergem - uns falam em 4 a 11 anos, outros de 5 a 10 anos de idade; ficamos aqui com a segunda possibilidade por ser a mais encontrada nas fontes – mas, sistematicamente, ano após ano, a fotógrafa utilizou sua filha como modelo em fotografias branco & preto de extremo apuro e ousadia. Ousadia até maior que a encontrada nas demais imagens obsessivas produzidas por Ionesco, muito maior. Eva aparece em nus, mas o efeito aterrador é o mesmo se ela é capturada vestida, como isso? É intrigante.
Assim a menina Eva surge como criança-mulher nos mesmos ares sombrios, ornada com dezenas de jóias ou bijuterias ordinárias, artefatos que falam deste mundo particular onde convivem delírio, morte, sensualidade e paixão. Seria quase uma entidade, um totem, um mito... Mas Eva era e é real: o choque é inevitável. Comunidade artística e opinião pública se puseram maciçamente contra Irina; a primeira – que já classificava seu trabalho como um desfile de maus gostos – considerou a coleção como o ápice dos absurdos, aquilo simplesmente não era arte. Já o público, numa oposição já esperada e recorrente, a execrou alegando uma falta explícita de moralidade.
Nada disso, logicamente, impediria Eloge de ma fille de entrar para a história da fotografia e do erotismo. Mesmo hoje, em que vivemos tempos de tão intenso tráfego de material de pedofilia, tempos que talvez nos turve a visão para certos aspectos fascinantes do bizarro ou do cruel, as fotografias que Irina Ionesco fez de sua filha permanecem inadvertidamente cheias do mesmo conceito, da mesma busca pela natureza do ser mulher vista através dos anos que passam para Eva e a revelam tão ou mais terrível (e uso terrível no sentido de espantoso) que a Lolita de Nobokov.
fonte:
Mme. Ionesco: a dama do erotismo
Eva sob o olhar de Irina Ionesco: dos 5 aos 10 anos
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